Foto: https://pt.wikipedia.org/wiki/Tristan_Corbi%C3%A8re
Tristan Corbière, chamado Édouard-Joachim Corbière (Coat-Congar de Comuna francesa, Morlaix (Finisterre), 18 de Julho de 1845 - Morlaix, 1 março de 1875) foi um poeta francês. Viveu a maior parte de sua vida no mesmo lugar, e aí recebeu o apelido pelo qual ficou conhecido. Faleceria de tuberculose com a idade de 29 anos.
CORPO ESTRANHO. REVISTA DE CRIAÇÃO 3 . Coordenação editorial Julio Plaza & Régis Bonvicino. São Paulo: Editora Alternativa, janeiro-junho 1982. Ex. bibl. Antonio Miranda
Tristán Corbière, mais um poeta que não teve tempo para envelhecer.
Morto aos 30 anos, em 1875, o tuberculosos Corbière deixou apenas um livro de poemas, publicado em 1873: "Les Amours Jaunes" / "Os Amores AMARELOS". Uma poesia de sabor inconfundível.
MARGINAL, se universidade ou antologia, passou a vida entre os marinheiros da "costa quebrada da dura Bretanha", ele o cão vira-lata, a que seu se próprio nome de TRISTAN.
Periférico, não conheceu o eco e a glória de seus contemporâneos Baudelaire (de quem parodiou o poema "La Pipe" em seu "La Pipe Au Poète"). Mallarmé, Rimbaud e Verlaine, que o "revelou" a um público maior no famoso libelo "Poètes Maudits", de 1884, 9 anos após sua morte.
Pintor e desenhista mal sucedido, Corbière atinge seus cumes numa linguagem bastante peculiar, construída na base de paradoxos, popular mas sofisticada, cheia de sutilezas e imprevistos: "... a poesia de TC , o verso de TC, seu talento para a ESTRUTURAÇÃO, para a montagem de takes aparentemente desconexos, sua capacidade de objetiva idéias e sentimentos..."
(Mário Faustino, in POESIA EXPERIÊNCIA).
O tom meio bufo, meio desesperado de sua poesia é distanciamento/estranhamento de seu próprio feeling.
Humor, (auto) ironia, sarcasmo: armas quentes e afiadas no combate ao PATHOS.
Uma inesgotável fantasia, temática/crítica, desconcertante e, sobretudo, imprevisível
Corbière, "violer d´amoress jaines", buscou a poesia, ao contrário da maior parte dos poetas, onde ela não estava: no cais do porto, na fala dos "lobos do mar", no jargão de rua, no clichê e no lugar comum FEITO INCOMUM.
NO Brasil, país da LÁGRIMA ESCRITA e da sisudez, Pedro Kilkerry, outro renegado, foi o primeiro a descobrí-lo e a traduzí-lo: "Le Crapaud" / "O Sapo", 1911,
[ "... mas, olha-o, sem asa, é um poeta pelado.."]
Em Portugal, no "Portugal Futurista", Mário de Sá-Carneiro utilizou-se [consciente ou inconscientemente, pouco importa saber) de técnicas muito semelhante às de Corbière em boa parte de sua poesia, principalmente em seus "Últimos Poemas". Compare-se o genial soneto AQUELEOUTRO, de 1916, [... Em vez de pajém bobo presunçoso / Sua alma de neve asco de um vômito..." ou ainda " ... O corrido o raimoso o desleal /O balofo arrotando Império Astral..."]
com trechos do não menos genial ÈPITAPHE (... Idealista, — sem idéia. Rima / Rica — sem matéria prima;/ De volta, — sem nunca ter ido; / Se achando sempre perdido..."]
Nos anos dde 60, Augusto de Campos não só o traduziu em bloco (7 poema, inclusive o dificílimo ÉPITHAFE, já mencionado,) como o introduziu de fato na aguada corrente sanguínea de nossa poesia.
Eis porque vale à pena (e à imaginação) re/traduzir, nas pistas de uma (mini) anti-tradução, TRISTAN EDOUARD CORBIÈRE, poeta coloquial-irônico, "artista sem arte, ao inverso".
Paulo Leminski / Régis Bonvicino
À L´ETNA
Sicelides Musae, Paulo majora canamus.
VIRGILE.
Etna — j´ai montgé le Vésuve…
Le Vésuve a beaucoup baissé :
J´etais plus chaud que son effluve,
Plus que sa crête hérissé…
— Toi que l´on compare à la femme…
— Pourquoi — Pour on âge ? ou ton âme
De caillou cuit ?... — Ça fait rêver…
— Et tu t´en fais rire à crever ! —
— Tu ris jaune et tousses : sans doute,
Crachant un vieil amour malsain ;
La lave coule sous la croùte
De ton vieux cancer au sein.
— Couchons ensemble, Camarade !
Là — mon flanc sur ton flanc malade :
Nous sommes frères, par Vénus,
Volcan !...
Un peu moins… un peu plus…
Palerme. — Aoút.
AO ETNA
Sicelides Musae, paulo majora canamus.*
(Virgilio)
Etna — trepei sobre o Vesúvio
( E ele baixou lá um bocado)
Ardendo mais que o eflúvio,
Mais do que o seu bico eriçado...
— Por que te comparam à fêmea?...
— Por tua idade? ou alma gêmea
Do seixo friot? — Faz cismar...
— E tu te ris até rachar! —
Ris amarelo, tosses, mascas
Um velho amor enfermo, sei-o;
A lava escorre sob a casca
Do velho câncer no teu seio.
— Deitemos juntos, Meu Querido!
Meu flanco e o teu doente, unidos:
Pois nós somos irmãos, por Vênus,
Vulcão!...
Pouco mais... ou menos...
(Trad. livre: Musas da Sicília, elevemos
um pouco mais nosso canto)
Tradução: Nelson Ascher / Régis Bonvicino
ago / nov 1981
LAISSER-COURRE
Musique de: Isaac Laquedem.
J´ai laiseé la potence
Après tous les pendus,
Andouilles de naissance,
Maigres fruits défendus ;
Les plumes aux canards
Et la queue aux renards…
Au Diable aussi sa queue
Et ses cornes aussi,
Au ciel sa chose bleue
Et la Planète — ici —
Et puis tout : n´importe où
Dans le désert au clou.
J´ai laissé dans l´Espagne
Le reste et mon château ;
Ailleurs, à la campagne,
Ma tête et son chapeau :
J´ai laissé mes souliers,
Sirènes, à vos pieds !
J´ai laissé par les mondes,
Parmi tous les frisons
Des chauves, brunes, blondes
Et rousses… mes toisons.
Mon épée aux vaincus,
Ma maîtresse aux cocus…
Aux portes les portières,
La portière au portier,
Le bouton aux rosières,
Les roses au rosier,
À l´huys huissiers,
Créance aux créanciers…
Dans mes veines ma veine,
Mon rayon au soleil,
Ma dágaine en sa gaine,
Mon lézard au sommeil ;
J´ai laissé mes amours
Dans les tours, dans les fours…
Et ma cotte de maille
Aux artichauts de fer
Qui sont à la muraille
Des jardins de l´Enfer ;
Après chaque oripeau
J´ai laissé de ma peau.
J´ai laissé toute chose
Me retirer du nez
Des vers, en vers, en prose…
Aux bornes, les bornés ;
À tous les jeux partout,
Des rois et de l´atout.
J´ai laissé la police
Captive en liberté,
J´ai laissé La Palisse
Dire la vérité…
Laissé courre le sort
Et ce qui court encor.
J´ai laissé l´Espérance,
Viseillissant doucement,
Retomber en enfance,
Vierge folle sans dent.
J´ai laissé tous les Dieux,
J´ai laissé pire et mieux.
J´ai laissé bien tranquilles
Ceux qui ne l´étaient pas ;
Aux pattes imbéciles
J´ai laissé tous les plats;
Aux poètes la foi…
Puis me suis laissé moi.
Sous le temps, san égides
M´a mal mené for bién
La vie à grandes guides…
Au bout de guides — rien —
… Laissé, blasé, passé,
Rien ne m´a rien laissé…
PARADE
(oubliée)
Place S.V.P. Provinciaux
de Paris & Parisiens de
Carcassonne !
Et toi, va mon Livre —
Qu´une femme te corne,
Qu´un fesse-cahier te
fesse, qu´un malade
te sourie !
Reste pire —
tes moyens te le permettent.
Dis à ceux
du métier que tu es un
monstre d´artiste…
Pour les autres : 7 f. 5o.
Va mon livre & ne
me reviens plus.
DEIXAR CORRER
música : Isaac Laquedem
deixei a polícia
atrás dos bandidos
vendendo malícia
para os entendidos
as penas aos patos
e as gotas aos gatos
ao diabo seu rabo
seus chifres também
ao céu seu descaso
e o planeta — além,
enfim, não importa
quem abra essa porta
deixei lá na espanha,
o resto, um castelo
quem chora não ganha
meu melhor chinelo;
deixei minha voz,
sereias, a vós!
deixei pelos mundos
de tantos cabelos
de calvas e ruivas
morenas... meus pelos
espada aos vencidos,
amantes aos traídos
às portas, porteiras
porteira, ao portal
botão às roseiras
rosas ao rosal
coroa aos coronéis
quartos aos quartéis...
nas veias a veia
meu raio pro sol
aragem na areia
em contra e em prol
deixei meus amores
nos fornos, nas torres...
e minha armadura
no bolso dos ternos
que a gente pendura
no quinto dos infernos
após cada choro
deixei o meu couro
deixei um negócio
me tirar do peito
meu jeito pro ócio,
negócio suspeito
aos jogos olímpicos
todos os meus ímpetos
deixei a tolice
presa em liberdade
deixe lapalisse
dizer a verdade...
deixei de bobagem
no meio da viagem
deixei a esperança
morrendo de tédio
um filho na pança
não tem mais remédio
deixei de rezar,
deixei sorte e azar
deixei bem tranquilo
o louco furioso
deixei tudo aquilo
que me dá mais gozo
aos poetas, fé...
eu nem sei quem é
a vida vivida
me maltratou tão bem
que no fim da vida
só vejo ninguém
ninguém me deixou
estrear meu show
Tradução: Paulo Leminski /81
PARADA (esquecida)
À praça, por favor, mocós
de São Paulo, paulistas
de Salvador!
Te manda, meu Livro —
Que uma mina te faça cornudo,
Que um estruturalista te disseque o conteúdo,
Que um pobre coitado, doente,
te leve a sério!
E vá para o cemitério —
Estás habilitado, meu Livro.
Digas àqueles
do métier que tu és um
monstre d´artiste...
Aos poucos,: só na grana.
Vá, meu Livro,
& vê se desencana.
Tradução: Aldo Fortes.
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Página publicada em novembro de 2022
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